“Mãos Limpas”: Ex-secretária da SIMS e mais seis são acusados de fraude em licitação e peculato

Publicado em 02/09/2014 16:06:42. Atualizado em 18/04/2024 19:36:18.

O Ministério Público do Amapá (MP-AP) ingressou, nesta terça-feira (02/09), com uma Ação Penal Pública junto ao Tribunal de Justiça do Estado (TJAP) contra a ex-secretária de inclusão e mobilização social do Amapá e mais seis pessoas, acusadas de peculato, fraude e dispensa ilegal de licitação. Pelos mesmos fatos responderão, ainda, por atos de improbidade administrativa. As investigações resultam da vasta documentação apreendida pela Polícia Federal durante a operação “Mãos Limpas”.

Segundo os documentos contidos no Inquérito Policial nº 681, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), os acusados realizaram, de forma fraudulenta, licitação para a contratação de empresa especializada na prestação de serviços voltados ao fortalecimento da sociedade civil organizada, através de capacitação de entidades na Política Nacional de Assistência Social, associativismo, procedimentos administrativos, gerenciais e cooperativismo.

A denúncia revela que a licitação, desde o início, veio contaminada pela fraude. A estimativa de preço prévia à licitação foi realizada com três empresas sediadas fora do Estado do Amapá, sendo uma, em São Paulo/SP, uma em Brasília/DF e uma terceira, em Fortaleza/CE.

As empresas citadas no processo licitatório foram: Equality Consultoria, Consulte RH e Consultores Associados e Serap Serviço de Acompanhamento e Assessoria Pública, que segundo o pregão presencial nº 011/2008, teriam feito as seguintes propostas: R$ 856.900,00; R$ 962.722,00 e R$ 897.000,00, respectivamente.

Ocorre que, nenhuma dessas empresas, em momento algum, enviou qualquer tipo de propostas ao Estado do Amapá. A empresa Consulte RH, que tinha como representante legal a senhora Iara Bayma Fernandes Negreiros, declarou, em oitiva prestada na Polícia Federal, que nunca esteve no Estado do Amapá.

As outras duas empresas, Equality Consultoria e Serap, por meio de seus representantes, Oswaldo Fernandes Granado e Fred Pereira Joca, respectivamente, também demonstraram que as propostas emitidas em nome das empresas eram falsas. Ambos, em resposta aos peritos da PF, informaram não reconhecer as propostas formuladas como sendo das empresas de sua propriedade.

Portanto, tudo não passou de uma maquiagem produzida pela associação criminosa instalada na Secretaria de Ação Social do Estado do Amapá (SIMS).

Mais detalhes do esquema

Além de estimar preços inexistentes, o aviso de licitação, em razão do seu elevado valor, sequer foi publicado em jornal de grande circulação, contrariando o disposto na Lei 10.520/2002 e o entendimento do Tribunal de Contas da União (TCU). Essa exigência objetiva levar ao maior número de interessados o conhecimento acerca da licitação, tudo em obediência aos princípios da publicidade, isonomia entre os possíveis interessados e economicidade.

Além de não publicar aviso do edital em jornal de grande circulação, o pregão estabeleceu como critério de julgamento o Menor Preço Global da proposta ofertada, o que obriga que cada empresa interessada em participar da licitação esteja apta a oferecer todos os serviços licitados que, neste caso, incluiria cursos de diversos assuntos e elaboração, impressão e publicação de cartilhas e manuais.

“Cada empresa interessada tinha que apresentar vasta documentação e, cerca de 14 atestados de diversos órgãos, capazes de comprovar a capacidade e idoneidade para a concorrentes. A partir dessa fase, a denúncia revela mais um forte indício de fraude. A empresa vencedora do pregão, no caso o Instituto Vidas Parceiras, apresentou 14 atestados e declarações, onde podemos listar alguns dos vários indícios de fraude”, descreve o promotor de Justiça André Araújo, que subscreve as ações.

Dentre as provas colhidas, contam que várias declarações utilizadas pela empresa vencedora (Instituto Vidas Parceiras), incluindo documentos supostamente emitidos pelas prefeituras de Novo Oriente (CE), Palhano (CE), Carnaubal (CE) e Aiuaba (CE), estavam com a mesma data, exatamente o mesmo texto e a mesma formatação, tendo alterado apenas o timbre, o nome do prefeito e a cidade.

Além disso, as assinaturas dos prefeitos de Novo Oriente e Aiuaba, constantes dos atestados, não coincidem com as assinaturas de suas CNHs, sequer a forma e dinâmica dos traços possuem semelhanças.

“Não restam, pois, quaisquer dúvidas que o procedimento licitatório foi fraudado e direcionado para beneficiar o Instituto Vidas Parceiras. No fim, conforme se vê no relatório do inquérito anexo, a contratação do citado Instituto se deu por R$ 780.000,00, conforme publicado no D.O.E de 7-7-2008. O esquema fraudulento, então, estava pronto e devidamente articulado para lesar o patrimônio público”, assevera o promotor de Justiça Manoel Edi, que também assina as ações.

Outros indícios de beneficiamento do instituto Vidas Parceiras

No ano de 2009, mais uma fraude é concretizada na Justificativa nº 031/2009-CEL/GAB/SIMS. O processo mencionado resultou, novamente, na contratação do Instituto Vidas Parceiras, desta vez para realizar curso de capacitação de Conselheiros Estaduais e Municipais e Assistência Social e dos Direitos da Criança e do Adolescente do Estado do Amapá, com dispensa de licitação, em razão da desclassificação de todas as propostas por preço, manifestamente superiores aos praticados no mercado nacional.

Em 26/10/2009, foi realizada a sessão do pregão, cuja ata registra a apresentação de propostas pelas empresas E.J.R. BARBOSA – EPP e I.G.ANDRADE-ME, porém, não informa quais os valores dessas propostas. Essa mesma ata registra que o certame foi julgado fracassado, em razão dos preços ofertados estarem acima dos preços estimados pela administração. “Daí se faz uma indagação: como saber se os preços ofertados estavam acima dos estimados, sem ter os preços registrados em ata? A única reposta possível é o dolo, a intenção de fraudar o procedimento licitatório”, questiona o promotor André Araújo.

A contratação direta se deu justamente com o Instituto Vidas Parceiras pelo valor de R$ 48.000,00, entidade que havia apresentado, outrora, o valor estimado de R$ 92.903,22. O que causa maior perplexidade é que o valor contratado foi superior ao estimado pela empresa CESFPA, sendo esta empresa preterida, mesmo tendo, em fase prévia de estimativa, ofertado valor inferior ao contratado com o “Vidas Parceiras”.

“Conclui-se que a SIMS mantinha uma verdadeira associação criminosa para fraudar licitações e causar prejuízo ao erário, de forma descarada e sem qualquer respaldo legal e constitucional”, reforça o promotor Manoel Edi.

Cada demandado tinha um papel importante no esquema criminoso

Marília Góes era a mentora de todo o esquema, sendo a ordenadora de despesas, na qualidade de secretária da SIMS, de modo que tinha conhecimento e compactuava com todas as fraudes perpetradas no interior da secretaria, da qual ela era gestora.

Hécia Sousa era secretária adjunta da SIMS e, ainda, mantinha relação estreita com os donos do Instituto Vidas Parceiras. No decorrer das investigações foi autorizada a interceptação telefônica dos envolvidos, ficando clara a sua ligação com Carlos Colana e a conduta desvirtuada dos envolvidos no trato de convênios.

Júlio Cesar Paes de Araújo era o Gerente da Unidade de Material e Patrimônio e foi o responsável pelo envio da estimativa de preços, a qual foi negada pelas três empresas, supostamente, participantes. Logo, era conhecedor da fraude desde o seu princípio.

Marcus Vinicius de Barros era o pregoeiro responsável pela licitação, sendo omisso na observância aos dispositivos legais, bem como, declarou o Instituto Vidas Parceiras como empresa vencedora, sendo a única participante do pregão.

Paulo Roberto e Carlos Colona como representantes da empresa vitoriosa foram diretamente beneficiados pelo esquema fraudulento, que gerou enorme prejuízo ao erário público.

Dumitru Purcaru exercia o cargo de assessor de desenvolvimento institucional, vindo a, posteriormente, ocupar, de forma “curiosa”, a direção do Instituto Vidas Parceiras.

Crimes praticados

Fraude e dispensa ilegal de Licitação, delitos previstos nos artigos 89 e 90 da Lei Federal nº 8.666/93). “Há também, fortes indícios da prática de peculato (art. 312 do Código Penal) pelas denunciadas Marília Góes e Hécia Sousa, pois a análise da movimentação financeira e patrimonial demonstra que ambas possuíam bens, em valor e quantidade totalmente incompatíveis com as rendas declaradas, que, evidentemente, são resultado do esquema criminoso montado por ambas para fraudar licitações no âmbito da SIMS”, finaliza o promotor André Araújo.

Denunciados na Ação Penal

Marília Brito Xavier Góes; Hécia Maria da Silva Sousa; Julio Cesar Jacome Paes de Araújo; Marcus Vinicius de Barros; Paulo Roberto Chaves Rebolças; Carlos Colonna Filho e Dumitri Purcaru.

Ação por atos de improbidade administrativa

Os mesmos responderão, também, na esfera cível, por atos de improbidade administrativa, que visa, dentre outros, ressarcir o dano causado ao erário por meio do bloqueio de bens e outras medidas consideradas necessárias pela justiça.

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